A recente sanção presidencial à lei brasileira sobre mudanças climáticas, as novas previsões sobre a safra de grãos no País (10/2), ao lado do noticiário sobre desastres provocados por chuvas e inundações nos últimos meses, reafirmam que o País precisa preocupar-se - e muito - com a questão do clima.
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Embora se anteveja um aumento da safra de grãos, há culturas e regiões nas quais a queda tem sido relevante, como é o caso das safras de milho, feijão e arroz em partes do Centro-Oeste ou do arroz no Sul. E no Centro-Oeste ela tende a continuar.
O tema é ainda mais preocupante quando se toma conhecimento do estudo Economia da Mudança do Clima no Brasil, feito por 11 institutos universitários de pesquisa, coordenado por Carolina Dubeux, da Coppe-RJ, e divulgado pelos jornais (7/2). Ali se mostra que em 40 anos, dependendo do cenário, o Brasil poderá perder R$ 3,6 trilhões em suas safras, por causa de problemas climáticos. E isso inclui redução de áreas aptas para culturas alimentares e acesso mais limitado à água. Que podem resultar também em maior pressão para ocupar áreas de florestas. O Estado de São Paulo, no pior cenário, pode perder R$ 1,2 trilhão.
A preocupação não é só brasileira, mas outros países estão à nossa frente em estratégias e cuidados. A Inglaterra - para citar apenas um - tem um Ministério do Meio Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais que já implanta uma estratégia de segurança alimentar planejada para 20 anos, que propõe até uma revolução tecnológica. E uma descentralização da produção e do comércio, para que eventuais danos sejam menos amplos. Além disso, está mergulhada numa discussão com produtores e consumidores sobre a necessidade - ou não - de reduzir o consumo de carne vermelha, da mesma forma que o consumo de fertilizantes, pesticidas e combustíveis na produção de alimentos.
Também da ONU vêm notícias (Estado, 18/12) das consequências que poderá ter na área de alimentos um aumento de 3 graus Celsius na temperatura do planeta - o horizonte mais provável com a redução insuficiente de emissões de gases oferecida pelos países industrializados e pelos “emergentes”. As consequências de secas e enchentes seriam muito fortes nas colheitas de países tropicais e mais 550 milhões de pessoas - além do 1 bilhão atual - estariam expostas à fome.
Nesse quadro, a Lei de Mudanças Climáticas sancionada pelo presidente da República parece ainda tímida, ao propor como objetivo reduzir entre 36,1% e 38,9% as emissões brasileiras, calculadas sobre o patamar a que chegariam em 2020 tomando como base o de 2005. Isso equivaleria a cerca de 300 milhões de toneladas anuais de poluentes e ainda deixaria o País com pouco mais de 1,9 bilhão de toneladas/ano (cerca de 10 toneladas anuais por pessoa se até lá a população não crescer muito).
Na apresentação que o ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, fez ao Senado sobre o inventário brasileiro de emissões - ainda em preparação e com prazo até março de 2011 para ser submetido à Convenção do Clima -, as emissões brasileiras em 2005 são calculadas em 2.205,3 milhões de toneladas (em equivalentes de carbono), com um aumento de 48,4% sobre 1994, ano do inventário anterior, quando eram 1.484,9 milhões de toneladas. E aumento de 61,7% sobre 1990, quando estiveram em 1.362,3 milhões de toneladas. Um ritmo de crescimento muito preocupante, embora o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) levante questões sobre a conversão do metano em carbono (multiplicando por mais de 20 o número) nos cálculos, que tem muita importância no caso brasileiro.
Seja como for, a comunicação do MCT atribui a “mudanças no uso do solo e florestas” nada menos que 76,3% das emissões em 2005, com 1.202,1 milhões de toneladas, quando eram 747,8 milhões de toneladas em 1994 e 709 milhões em 1990 - ou seja, um aumento de 60,7% sobre o inventário de 1994 e de 69,5% sobre 1990. Ao setor de energia cabem 22% das emissões, aí incluídos o transporte, a indústria e residencial. Mas as emissões por esse caminho (346,9 milhões de toneladas em 2005) aumentaram 71% dede 1990.
Uma das questões mais complexas é mesmo a das emissões brasileiras de metano (13,465 milhões de toneladas), de que a agropecuária responde por 71%, principalmente com os gases resultantes da fermentação entérica, no processo de ruminação de alimentos pelo gado. Mas, como está dito atrás, o processo de conversão, multiplicando por 21 os números do metano, resultaria num total de 282,7 milhões de toneladas, equivalentes a cerca de 80% das emissões de todo o setor de energia, incluídos indústria e transportes. Mas essa conversão é posta em questão pelo governo brasileiro e por muitos cientistas. Principalmente porque está em discussão no âmbito do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), órgão científico da Convenção do Clima, uma tese de que essa equivalência deve ser reduzida a 3 ou 4, por causa do tempo menor de dissipação do metano e outros fatores (como já se comentou aqui em outros artigos).
Seja como for, é um quadro que precisa ser trabalhado pelo Brasil. Porque o País já é vítima de desastres climáticos severos, porque se prevê agravamento desse panorama - e ainda não temos uma política abrangente de adaptação às mudanças - e também porque se intensificam as pressões para assumir compromissos (e não apenas metas voluntárias de redução de emissões). E até porque uma redução de menos de 15% sobre as emissões de 2005 parece insuficiente.
O início da campanha eleitoral com certeza aumentará as discussões sobre o tema, como também já se comentou aqui. O que disseram na reunião de Copenhague três candidatos a presidente (Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva), além do presidente Lula, não terá como ficar fora das teses apresentadas ao eleitorado. E será um avanço ver o tema discutido em âmbito nacional.
*Washington Novaes é jornalista E-mail: wlrnovaes@uol.com.br
(Envolverde/O autor)
Fonte: Mercado Ético - http://mercadoetico.terra.com.br/arquivo/que-faremos-com-o-clima/
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